Por *Henrique Carbonell, CEO e co-fundador da F360
A palavra “reforma” costuma gerar desconfiança, especialmente quando falamos de impostos. Não é diferente com a Reforma Tributária, a maior mudança no sistema fiscal brasileiro em décadas, que impactará diretamente o varejo, um setor marcado por margens apertadas, alta competitividade e complexidade operacional. Ainda assim, em meio às incertezas, surge uma oportunidade relevante: construir um ambiente mais previsível, eficiente e favorável ao planejamento de longo prazo.
A proposta central da reforma é a simplificação. O modelo de IVA Dual, composto pela CBS (federal) e pelo IBS (estadual e municipal), substituirá tributos como ICMS, ISS, PIS e Cofins. Com isso, o Brasil caminha para um sistema mais uniforme, transparente e previsível, encerrando um histórico de sobreposições e insegurança jurídica que há anos penaliza o varejo.
No longo prazo, a unificação tende a reduzir a burocracia e eliminar distorções regionais, como as 27 legislações diferentes de ICMS. Alguns segmentos serão diretamente beneficiados: itens da cesta básica terão redução significativa ou até isenção de carga tributária, enquanto bares e restaurantes poderão ter alíquotas cerca de 40% menores, aliviando as margens e estimulando o consumo.
Por outro lado, setores que hoje se apoiam em incentivos fiscais regionais (como eletrônicos e vestuário) podem enfrentar aumento de preços, já que a alíquota unificada deve ficar entre 25% e 28%. O fim da chamada “guerra fiscal” exigirá uma revisão profunda de estratégias de precificação, negociação com fornecedores e eficiência operacional, já que vantagens tributárias locais deixarão de existir.
Nesse novo cenário, a previsibilidade se torna um ativo estratégico
Com regras nacionais e alíquotas padronizadas, o varejista passa a conseguir projetar com mais precisão o impacto dos tributos, construir orçamentos mais confiáveis e planejar margens com maior segurança, um avanço fundamental em um setor que opera centavo a centavo.
A reforma também altera de forma relevante a dinâmica do caixa. O split payment, que retém automaticamente os impostos no momento da venda, reduz riscos fiscais, mas exige maior rigor na gestão financeira. Em vendas parceladas, por exemplo, o imposto será recolhido integralmente na primeira transação, enquanto o recebimento ocorre ao longo dos meses, demandando ajustes no capital de giro.
Por outro lado, a não-cumulatividade plena permitirá a recuperação integral dos créditos tributários ao longo da cadeia, eliminando o “imposto sobre imposto”. Na prática, o varejista passa a tributar apenas o valor agregado, o que representa ganho direto de margem e maior racionalidade na formação de preços.
O período de transição, entre 2026 e 2033, será o mais desafiador. Operar simultaneamente com o sistema antigo e o novo exigirá revisão de processos, adaptação de ERPs e maior integração entre áreas fiscal e financeira. Nesse contexto, a tecnologia deixa de ser apoio e passa a ser essencial para evitar erros, multas e perdas de rentabilidade.
No curto prazo, a Reforma Tributária traz dúvidas. No médio e longo prazo, traz oportunidade. O varejista que investir desde já em planejamento, tecnologia e gestão financeira transformará previsibilidade em vantagem competitiva. Afinal, embora a reforma trate de impostos, seu verdadeiro impacto será sobre quem souber usar clareza e eficiência como motores de crescimento.
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