Há poucos dias, durante uma conversa com um grande executivo do setor, ouvi uma afirmação instigante: “o Brasil está muito próximo do limite de expansão de lojas de atacarejo”, disse ele. Em outras palavras, abrir novas unidades pode deixar de gerar crescimento real de vendas. Para ele, o desafio agora é “roubar” participação de mercado dos concorrentes, e não simplesmente ampliar o volume total do setor.
Intrigado, decidi ouvir outros executivos de varejo e as respostas foram surpreendentemente similares. Há uma percepção generalizada de que o atacarejo atingiu um nível de saturação geográfica e de oferta para os modelos convencionais. Fui então em busca de dados que corroborassem essa hipótese e que pudessem provocar reflexões estratégicas mais profundas para todo o setor.
Segundo a ABAAS (Associação Brasileira dos Atacarejos), em 2024 o canal atacarejo cresceu cerca de 6% em número de lojas em relação a 2023. Já o SA+ Ecossistema de Varejo (plataforma de inteligência e conteúdo que conecta varejistas e fornecedores) aponta que aproximadamente 7,5 em cada 10 lares brasileiros compraram em lojas desse formato ao longo do ano.
A mesma plataforma projeta que, em 2025, a participação do atacarejo nas ofertas promocionais do varejo alimentar poderá atingir 29%, um recorde histórico. Considerando o ritmo atual, um estudo do Itaú BBA estima que a saturação do modelo ocorrerá por volta de 2026, quando o número de unidades deve chegar a 2.465 em todo o país.
Com esses dados em mãos, torna-se evidente que a fase de expansão pura, ou seja, abrir mais lojas e cobrir novos municípios, está se tornando cada vez mais difícil de sustentar. Os custos logísticos, a escassez de locais estratégicos, o acesso à mão de obra qualificada e a concorrência interna entre unidades já instaladas tornam mais complexa e onerosa a promoção de um crescimento orgânico eficiente.
Para quem lidera ou pretende liderar operações de atacarejo, esse momento de maturidade exige uma mudança de mentalidade e de competências. O desafio agora é migrar do foco em volume para a busca por eficiência competitiva.
Isso significa disputar mercado com concorrentes já estabelecidos, aprimorar o mix de produtos e a diferenciação (não apenas no preço, mas também na experiência, no sortimento e no serviço), revisar formatos de loja, investir em canais digitais e integração, atender públicos com demandas específicas, fortalecer parcerias com a indústria para otimizar fornecimento e políticas de preço, além de adotar uma disciplina analítica rigorosa, com processos bem desenhados e forte controle de custos. Em uma fase de maturidade, ajustar o portfólio, reposicionar unidades ou até mesmo fechar lojas deve estar no radar estratégico.
O atacarejo foi um dos grandes motores de crescimento do varejo alimentar no Brasil. No entanto, toda curva de expansão intensa chega a um ponto em que simplesmente aumentar o número de lojas deixa de ser o caminho mais eficaz para gerar resultados expressivos.
Nesse novo cenário, quem vai se destacar é quem conseguir extrair mais valor de cada unidade, operando com inteligência estratégica e alinhamento com a indústria. A tendência é clara: novos pontos ainda terão espaço, mas o principal motor será como se opera e não quantos pontos se inaugura.
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